quarta-feira, 3 de março de 2010

A culpa, o medo e a estupidez humana

Em tempos de estupidez de reality show, encontrar algumas produções de mídia que massageiam o nosso intelecto é coisa rara. No fluxo contrário a toda boçalidade predominante, tive a oportunidade de assistir a um filme que abre uma ilha de reflexão sobre a culpa e o medo, Tempos de paz, com Tony Ramos, um chefe da alfândega em um Brasil pós-guerra e Dan Stulbach, no papel de imigrante polonês. 
O filme traz uma reflexão que tenho há tempos: até que ponto, a resposta "fiz porque estava cumprindo ordens" é válida? Muitas vezes se faz algo cumprindo ordens porque quem manda não tem a coragem de assumir os atos executados e quanto o executor o faz, quem ordenou quer distância dele pois o mesmo representa tudo aquilo que ele não quer lembrar que pediu para ser feito. O executor se torna descartável, o executor se torna executável.
Dizer que fazemos porque não tivemos escolha é outro equívoco. Sempre há escolha, mas o que há também são os ônus e bonus do que escolhemos. Não estamos dispostos a arcar com os custos, mas as escolhas estão sempre lá, basta que as façamos.
O personagem de Tony Ramos se mescla num sentimento de rudeza, frieza, amargura... essa é a palavra. Ele traz consigo um amargo do mais concentrado fel que a vida plantou-lhe no coração. Um homem sem máscaras esterotipadas dos vilões, porque ele não é um vilão. Ele, Segismundo, é ao estilo do filósofo alemão, demasiadamente humano.
Isso me assusta, mas também me encanta.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Cara de quem comeu e não gostou

Comer uma coisa nova é sempre um desafio. Sou resistente ao novo e quando viajo, procuro aquilo que já conheço. Sou definitivamente diferente daquelas pessoas que fazem o seu estômago uma espécie campo de provas, um Los Alamos gastronômico (Para quem não sabe, esse era o lugar onde se faziam os testes da primeira bomba atômica).
Gastronomia carregada de temperos, óleos, odores fortes são o prenúncio de uma revolução intestinal e algumas experiências que tive na Bahia me ensinaram que nem tudo que tem nome curioso e folclórico é para ser comido pelo visitante. Em Góias, insistiram para eu comer o tal do pequi. Topei, mas ao colocar no prato, fui advertido: - Não morde não que tem gente que já foi parar no hospital por causa de uns espinhos que tem dentro. Desisti, é impossível para mim comer um negócio que pede um Lexotan para você relaxar durante o consumo. Em Fortaleza, a insistência foi com uma sala de caranguejo. Provei e tive a sensação de que o bicho tinha sido morto depois de uma luta de vale-tudo. O que encontrei de ossinhos e coisas parecidas no meio, me desestimularam a repetir o prato. Em Ubatuba, paquerei a ostra. Daí, perguntei: Parece com o quê? Um colega respondeu – Tem o gostinho de limão que você coloca... mas parece um catarro. Desanimei com a comparação. Um catarro com gosto de limão.
Voltei de Belém há poucos dias e fui extremamente prudente com os sabores da terra que são tentadores por suas cores e cheiros. Daí, lembrei de algumas situações por que passamos quanto alguém lhe serve uma comida diferente.
- E aí? Gostou?
[nesse momento você pensa: minto ou sou sincero?]
- É... diferente, né.
-Você não gostou?
- Não. Não disse isso. Disse que é diferente o sabor.
- Você quer mais?
- NÃO!
- Viu. Você não gostou.
- Não. Eu não quero mais porque estou satisfeito.
- Ah.. mas tão pouquinho!
- Pois é.. eu como pouco.
- Come pouco porque não gostou...
Chega alguém. Um terceiro na conversa..
- Aí, fulano, ele não gostou da comida.
- Eu não disse isso.
- O quê?? Você não gostou...
- Gente, se falar que detestei esse troço e nunca mais caio na besteira de provar algo parecido a gente encerra esse ciclo?
...
Silêncio
- E do doce? Você gostou?
- ..afff

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A vaidade e a estupidez humana

A vaidade é o portal de todas as fraquezas, pois conduz a estupidez entorpecendo a capacidade de análise. Já trabalhei com pessoas que, em troca de elogios e reverências, mantinham ao redor de si a nata do despreparo, mas uma "nata" (sic) que se apresentava sempre pronta para lhes reverenciar aplausos e louvores ao menor sinal de suas presenças.
O risco que corre o vaidoso é o de construir uma mansão sobre varas de uma palafita e lhe foge a percepção de que, quem vende os elogios e admiração os faz a ele ou a qualquer outro que se encontre no alto da montanha. Até que a montanha venha a ruir e se torne uma planície. E, as pessoas se esquecem de que até as montanhas podem passar por esse processo.
O mais difícil para a maioria das pessoas é realmente, no topo da montanha, não deixar se seduzir pelos alisadores de ego. Eles vivem disso e é isso que os mantém onde estão. São como carpideiras, choram, mas porque são pagos para tal. E se trocam o defunto, choram de novo, pois essa é a sua função.
Somente a elevação e o desprendimento do espírito nos tornam imunes a isso. A experiência pela dor e o desprendimento do espírito como caminho de uns poucos afortunados. Eu não conheço nenhum ainda, mas sei que deve existir (ou já existiu). 
Sou da filosofia de que espírito é igual a aço de espada. Forja-se com muito fogo e muita porrada de martelo em cima.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Carnaval, tudo de novo, outra vez a mesma coisa... de sempre.

Em fevereiro, em fevereiro... tem carnaval, tem carnaval... já diz a musiquinha do século passado. E tem mesmo, sempre, tudo igual, de novo, outra vez, o mesmo. A Globo vai mostrar flashes do carnaval de Pernambuco com um monte de gente jogando as pernas para frente com sombrinha na mão. Na Bahia, vários trios elétricos com um monte de gente suada atrás e sempre há uma dança nova exatamente igual a velha, mas com nome de impacto. No Rio, o desfile das escolas de samba (com um ou dois BBBs desfilando) e, em São Paulo, uma espécie de série B do carnaval de escolas de samba, o pessoal misturando carnaval com rivalidades no futebol. 
Há o saldo de mortos e feridos por excesso de bebida, os acidentes de trânsito, os programas que dão dicas de como curar ressaca, as pessoas que distribuem camisinhas e os blocos dos homens vestido de mulher, algo que, um dia, em um estágio evolutivo superior eu, talvez, venha a achar alguma graça. E os blocos gays sempre coloridos, animados e desinibidos. Exatamente igual a parada gay que já aconteceu meses antes. Ah... ia me esquecendo dos chatíssimos concursos de marchinhas que consagraram genialidades como “a pipa do vovô não sobe mais”, “olha a cabeleira do Zezé” e outras pérolas (sic) do cancioneiro do folião.
Enfim, tudo igual outra vez de novo... a mesma coisa.

P.S.: Se não fossem os deliciosos dias de folga eu odiaria carnaval.

Outra coisa. O cara da foto acha que se deu bem, mas tenho para mim que ele pegou um travesti e só se deu conta quando a foto caiu na web. 

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Dicas de uma boa palestra - falando e sendo ouvido!



Palestra de mais de 60 minutos é um convite à dispersão e o pior é que o palestrante, muitas vezes, nem se dá conta disso. A comunicação oral é precedida de regras que a diferenciam de outras modalidades como a escrita. E, mesmo dentro da modalidade oral, ainda há distinções pois, uma apresentação de uma aula faz parte de um contexto imenso que ocupa um semestre ou um ano, já uma palestra para um público sobre um tema ocasional pede uma dinâmica muito mais ágil do que a usada em uma aula. O fato é que muita gente não sabe, ou ignora isso, fazendo de suas palestras uma tortura medieval que nos faz questionar que a morte não é a pior coisa do mundo. Mas eis que há cinco dicas para não ser o palestrante enquadrado no crime contra a humanidade (tortura).

1. Não abuse do tempo. 45 minutos é o mínimo, 60 minutos o ideal, 90 minutos é um exagero. Ninguém presta mais atenção e uma boa parte dos ouvintes já saiu para atender celular e não voltou mais. Observe.
2. Acredite. A sua platéia, principalmente em uma universidade, é alfabetizada. O que dispensa que você leia um papel para eles ou que fique lendo os slides de powerpoint que você está projetando.
3. Interaja com a platéia, exemplifique, mude o tom de voz. Uma pessoa falando, falando, falando... na sua frente de forma monotônica... sem retorno de quem ouve... dá um sono equivalente a uns 3 comprimidos de Alprazolan de 1 mg. Eu conheço esta experiência...
4. Seja espirituoso. Programa sua palestra para assumir tons de humor e provocar alguns risos. Rir libera endorfina, causa prazer, aumenta a memorização e cria empatia com seu público. Programe-se para fazer as pessoas se divertirem e aprenderem.
5. Evite apresentações teóricas para públicos ecléticos. As pessoas sabem que você sabe muito, por isso, pule essa etapa e vá direto a como a teoria se aplica ao dia-a-dia delas. Fale fácil, exempliqfique. Nunca se esqueça de que falar difícil é fácil. Difícil é falar fácil. 

Agora, na próxima palestra, você conseguirá entender melhor por que é tão pesado suportar certas pessoas falando e outras, quando termina a apresentação, dá um gostinho de “quero mais”.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Activia, intestinos e outros assuntos constrangedores

Uma coisa que gosto de ver é a desenvoltura e naturalidade com que a Patrícia Travassos fala sobre prisão de ventre ao encontrar com algumas moças na praia. Só de olhar para elas, ela já percebe que estão fazendo cocô todo dia. Juro que passei a observar as pessoas na rua e especular: esse faz todo dia, aquele ali não, aquele outro faz... Sinto que com o treino vou poder olhar nos olhos de cada um e dizer com segurança: - esse sim é um cagão cotidiano.
Faço piada, mas acho legal que se consiga falar de um assunto que é de interesse de todo mundo, afinal todos comem e todos têm intestino.  Meu filho, por exemplo, adora a musiquinha em que um cocô conta sua triste história e eu incentivo para que ele entenda que isso é plenamente normal.
Torço para o dia em que outros assunto se tornem menos tabu e as pessoas falem sem paranoias sobre impotência, ejaculação precoce, gases, corrimentos, hemorróidas. Não precisa ser tão descarada quanto a Patrícia Travassos ao encontrar alguém na rua.

- aí, hein, estou vendo pela sua cara que parou com aqueles puns horríveis.
ou
- olha, pelo seu jeitão vejo que os dias de brochinha acabaram.
ou
- Sentado tomando cerveja, hein.. deixa eu adivinhar: hemorróidas nunca mais né?

Convenhamos que é indiscreto, mas é engraçado.

sábado, 30 de janeiro de 2010

O dia em que as coisas perdem a graça

Acabei de vir da pracinha com meu filho. Ao redor havia muitos pais e mães que conduziam seus filhos de um brinquedo a outro. Eu empurrava o balanço do meu garotinho que seguia aquele movimento de vai-e-vem até parar por falta de impulso. Saí de um balanço e fui para outro do lado e fiz a mesma coisa. Meu filho dava risada durante o balançar e quando diminuia gritava: "qué". Para eu continuar dando embalo ao movimento.
Saímos dali e fomos para um brinquedo que rodava e ficava assim o tempo todo. As crianças faziam fila. Depois, passamos para uma gangorra e logo mais um escorregador. As trajetórias se repetiam inúmeras vezes. Um brinquedo balançava, outro girava, outro subia e descia... o outro.. era uma rampa em que se descia escorregando. Para mim, banal e repetitivo, para meu filho o ponto máximo de diversão de seu dia. De uma forma ou de outra, eu me divertia. Não com o brinquedo, mas com a felicidade dele.
Penso que a gente envelhece não é quando o tempo passa, quando o corpo enfraquece, quando as rugas aparecem. Envelhecemos quando as coisas perdem a graça e os brinquedos se tornam meros objetos de movimento circular, semi-circular, rampas deslizantes e vai por aí.
Reaprendi a graça que isso tem de novo, hoje, com os olhos do meu menininho.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Não tentem fazer isso em casa


Outro dia vi um daqueles mágicos que fazem e explicam a mágica (êta coisa sem graça!) fazer um truque em que havia uma caixa no meio de duas rampas. De um lado havia uma serra circular de uns 120 cm de diâmetro, de outro, outra serra do mesmo porte. À frente, havia um grande maçarico e, em cima, uma bigorna. O cara entraria na caixa, as serras desceriam dos lados, a bigorna cairia e o maçarico queimaria as laterais mostrando o mágico que não teria sofrido nada.
Antes de começar o truque, o locutor avisou:
- Não tentem fazer isso em casa!

Um aviso muito prudente e bem apropriado, já que a coisa mais comum é uma pessoa ter em casa, duas serras circulares de 120 cm de diâmetro, um maçarico, uma bigorna, duas rampas e uma caixa de madeira do tamanho de uma geladeira...
Eu, por exemplo, guardo essas minhas coisas sempre longe do alcance das crianças, perto dos remédios e dos produtos de limpeza.


sábado, 23 de janeiro de 2010

As coisas não precisam ter sempre sentido


Um dia eu estava assistindo a uma entrevista e o cara falava sobre o significado de alguns nomes. Lembrei dos filmes de caubóis em que o índio se chamava, Chero-toko, e os seus sempre explicavam que aquele nome significava “guerreiro selvagem que luta na lua com honra e perseverança”. E eu ficava pensando. Caramba, que poder de síntese.. tudo isso numa palavra pequeninha.
Acho que foi por conta desse poder de síntese que algumas tribos entraram em extinção. Explico. Chegou-se a um ponto tal que para o líder da tribo dar uma bronca o cara só olhava e falava: Ó...! e todos já entendiam seu sermão sobre a virtude, a honra, a sensatez e a presença de um deus imenso e bondoso que cuidava de todos. Num estágio evolutivo posterior, era só uma levantada de sobrancelha e os demais se prostravam de joelhos. Era um silêncio ensurdecedor.
Com o passar do tempo, todos morreram.. de tédio.
Mas, tudo isso é para falar que nessa busca por explicar os nomes surgem coisas absurdas e que me fizeram perder o gosto por etimologia (estudo da origem das palavras) muito cedo. Vez por outra aparece um a jornalista (sic) explicando que uma palavra se origina em uma outra expressão ou apresentando uma história mirabolante de um vocábulo. No fundo, é um chute atrás do outro, mas que é tão bem bolado que a gente sai repetindo por aí com ares de verdade universal.
Bom, salvo raríssimas exceções, me esquivo de etimologias e assumo que uma palavra significa o que ela quer dizer. Já gostei de contar que morcego vem do latim mus (rato) e cecus (cego) porque os antigos romanos acreditavam que morcegos eram ratos que envelheceram e criaram asas, mas, hoje, isso nem tanto. me agrada.
Continuo gostando das historinhas, mas para mim, morcego é um mamífero que parece com o rato e que voa. (ponto final)

P.S.: A coisa mais absurda que já ouvi foi que a expressão cuspido e escarrado para referir-se a semelhança entre pessoas vinha do termo “esculpido em carrara”. E desde quando quando alguém é igual ao outro parece com uma estátua de mármore carrara. A idéia é esculpido (semelhante fisicamente) e encarnado (semelhante no jeito de ser).