domingo, 8 de setembro de 2024

Senhas, senhas, senhas...

Juro que eu entendo a necessidade de políticas de senhas cada vez mais seguras, mas tem hora que acho que os caras exageram. Você digita uma possibilidade mais afim das que você usa e ele te mostra em vermelho...

Sua senha deve ao menos:

Oito dígitos

Um número
Uma letra maiúscula
Uma letra minúscula
Um símbolo alfanumérico

E ainda chegaremos ao dia em que acrescentarão...

Duas letras maiúsculas
Duas letras minúsculas
Um símbolo alfanumérico
Dois números pares
Dois números primos
Um algarismo composto em romano
Dois emojis
Uma sequência de números ímpares que não conste em suas identidades
Dois símbolos de operações matemáticas

Dias piores virão... 

Os bandidos nunca conseguirão saber nossa senha, inclusive, nem a gente. 

Deus abençoe a opção "recuperar senha"... amém


segunda-feira, 13 de maio de 2024

O que um coach milionário tem a ver com a lógica das redes sociais


 "Quando a eletricidade foi usada pela primeira vez na história da humanidade, Pablo Marçal foi o primeiro e postar sobre esse evento... no Instagram. E hoje, quando o Chat GPT não sabe alguma coisa, é com Pablo Marçal que ele tira suas dúvidas."


Com certeza você já ouviu uma dessas piadas ou viu algum vídeo debochando de Pablo Marçal, um goiano de 37 anos que faz muito sucesso na internet. Após construir uma gigantesca fortuna com suas dezenas de empresas multimilionárias (segundo ele) ele concentra suas atividades hoje em fazer Coach e vender almoços de estrogonofe por 5 mil reais. E tem quem pague. Acredite. Mas como dizia minha avó, enquanto houver cavalo, São Jorge não anda a pé.

Entretanto, o que aprendemos com Pablo Marçal? Em termos de acréscimo intelectual é algo próximo de zero, em termos de motivacional ele segue o mais do mesmo com eventuais esculachadas das pessoas para mostrar que elas não são ricas porque são preguiçosas, sem foco, limitadas em seus objetivos, escrotas mesmo e, deveria dizer, muito... (estou procurando uma palavra para não ser ofensivo, mas não acho. Então, complete você a lacuna) por ter pago uma fortuna para estarem ali e serem esculachadas. Ele não diz isso infelizmente. Mas então, o que aprendemos com ele?

Sim, ele é um mago da comunicação e ensina muito, mas de forma subliminar. Ele não fala literalmente, mas se você observar com calma, ele dá uma aula de o que é engajamento. E isto é o segredo da distribuição de qualquer conteúdo. As histórias não merecem o rótulo de ser verdade ou mentira. Afinal, às vezes, mentira é uma verdade que esqueceu de acontecer. E, se tratamos de Pablo de Marçal, ele não mente, é a realidade que falta com a verdade.


Brincadeiras à parte. Cada história maravilhosa proferida pelo coach (desde um avião sendo salvo, até um helicóptero que depende dele para conseguir ficar seguro ou mesmo uma boa colocação em uma prova de natação por uma pessoa que não sabia nadar no dia anterior.) Cada barbaridade lógica repercute em dezenas e milhares de mensagens do Twitter (agora X), vídeos de paródias, vídeos de especialista sinalizando o absurdo da afirmação do coach, milhões de comentários e textos inclusive esse texto aqui. 

Chegamos ao ponto principal da questão: sabem quanto ele gastaria para ter esse nível de engajamento nas redes? E isso gera uma reação em cadeia... como uma reação de uma bomba atômica. Isso, de forma paga, custaria uma pequena fortuna. Mas entregaram para ele de graça. Só precisou de contar o dia em que salvou a terra se jogando contra um asteroide... Ops, espera aí.. esse é Bruce Willys em Armagedon... e outra coisa.. Se ele está falando, ele não morreu... Mas tudo bem.. Isso é Pablo Marçal e essa história vai gerar centenas de paródias, comentários de especialistas e piadas na internet fazendo o autor expandir sua palavra para milhões de pessoa em um marketing orgânico fantástico.

E o mais incrível, gerar uma legião de adoradores e haters que lhe dão a maior moeda que a internet pode gerar: engajamento. Que no final das contas vai virar dinheiro e prestígio em algum momento.

Eu não estou dizendo que você deve sair inventando todo tipo de história fantástica para ganhar engajamento. Acredite. Isso não é tão simples, pois envolve talento e disposição. Mas eu quero é dizer que estamos diante de um personagem na internet que, enquanto estiver em alta, vai se dar muito bem. Uma hora, ele, como tudo na internet, vai morrer. Morrer e cair no completo esquecimento sendo lembrado com o um patético meme (como foi o rei do camarote, por exemplo)

Mas enquanto esse dia não chegar, ele vai sendo, na minha opinião, considerado o maior fenômeno da internet atual, um gênio da comunicação que entendeu perfeitamente o que significa engajamento.

Aí as pabletes dizem: É, mas ele está ganhando milhões e você? 

Não estou nem perto dos milhões (aliás, muito longe e nem chegue perto), mas esse argumento não anula ou desmerece em nada o explicado no texto. Vamos trocá-lo pelo silêncio e melhorar o mundo.. pelo menos, mais inteligente.

Pega o drive.
Instala o código.


quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Tempos difíceis, homens mais fortes

Não se trata de uma ode à privação e aos tempos difíceis, mas é fato que tempos difíceis forjam homens mais fortes e resilientes. As gerações que viveram o período mais duros (como as guerras, por exemplo) conheceram as privações, limites e dores muito cedo na vida. Isso forjou almas preparadas para lidar com a parcimônia, com as regras (por mais que discordassem) e com a resiliência de ser abatido pela dor, levantar e prosseguir. Enfim, criou-se uma geração de agentes e não pacientes de suas histórias.

Os tempos fáceis de fartura moldaram uma geração que se coloca como vítima de tudo, da sociedade, do capitalismo, do preconceito, da desigualdade, do melindre, do universo como um todo. Enfim, coisas que sempre existiram em uma escala muito maior do que se vê hoje, mas é uma geração que aprendeu que todos lhe devem algo, o estado, a sociedade, o sistema econômico etc. E esse sentimento de eterna dívida (que não vai ser paga porque não é assim que a banda toca) gera pessoas frustradas e incapazes de lidar com a dor e a privação que são coisas tão certas na vida quanto é a aurora e o entardecer. 

Os bancos de escola reforçam esse discurso porque, de certa forma, isentam-se da responsabilidade de criar agentes de suas histórias, mas acomodados pacientes em um mundo mau e injusto contra o qual a maior arma é o teclado do computador, as eternas lamúrias somadas à inércia absoluta da vítima eterna.


Pois é, garotada. Aprendam 3 coisas doloridas de se assimilar: 1. O mundo é injusto sim (você vai sentir isso na carne diversas vezes, acostume-se a aprenda a sobreviver acima dessa realidade) 2. Ninguém lhe deve nada (Se você não correr e muito atrás do que deseja, só lhe resta virar um reclamão chato para cacete que não produz nada além de reclamações e criticas vazias) e 3. A vida não vai lhe premiar pela sua capacidade de bater, mas de tomar porrada e levantar com a mesma dignidade. (fortes não são os que batem, mas os que caem mil vezes e se levantam)


Sim. Você vai sangrar muito e como dizia o Cazuza, a vida não tem "pódio de chegada bem beijo de namorada". Você é só mais um cara. O fato é que as gerações forjadas a ferro e fogo lidavam melhor com essa realidade. A vida vai doer e é assim que  funciona. O que nos resta é não focar no que acontece, mas no "como lidamos com isso". A dor é inevitável, o sofrimento é sempre opcional. 


domingo, 12 de setembro de 2021

Sabe onde você errou?

Quando as coisas não dão certo na vida da gente, a primeira pergunta que fazemos é "onde foi que eu errei?" Eu sempre fui um bom filho(a), um bom pai/mãe, um bom marido/esposa e, apesar de tudo isso, a vida só me entregou dissabor e ingratidão. Ou mesmo, me entregou episódios de tamanho infortúnio que, olhando assim de perto, eu juro nunca ter merecido.

Tirando a possibilidade de uma distorção de leitura sobre si mesmo (o que pode acontecer ocasionalmente) e considerando que você esteja correto em sua autoavaliação, o seu primeiro erro é entender sua conduta, por melhor que seja, como uma moeda de troca com a vida. A vida não barganha com você. Saiba que, ainda que você dê o melhor de si, que seja a melhor pessoa do mundo, se tiverem que te pregar numa cruz, as pessoas vão fazer. E sabe por quê? Porque sim, porque a vida não barganha com você. Aprenda essa lição número 1  - esperar barganha é o seu primeiro erro.

E isso quer dizer que não devo ser uma boa pessoa porque nada terei em troca? Não. Pelo contrário. Ser uma pessoa melhor faz o mundo ao seu redor ser mais leve o maior beneficiado dessa leveza é você mesmo. Isso a curto prazo. 

É importante entender que, apesar de nossas carências de reconhecimento (todos desejam likes), suas ações não devem ser como a interpretação em um palco e que você receberá aplausos ou vaias ao final. Esse é o segundo erro. Não haverá palmas no final.

E por fim, diante de uma ingratidão não cabe muito ficar discutindo a origem, as causas, os fatos prévios. Quando alguém é atingido por um tiro no peito, não faz o menor sentido discutir naquele momento que tipo de bala atingiu, de que material era feito, qual a estrutura mecânica da arma, onde foi fabricada, qual a formação e a habilidade do atirador etc enquanto o atingido segue no chão sangrando. O fato é que temos alguém ferido e devemos providenciar socorro para que não morra.

Na outra parte, ficar filosofando os eventos prévios citados depois que salvamos a pessoa é completamente inútil uma vez que não reverte os fatos. E aí podem dizer que entendê-los pode evitar que ocorram novamente. Não. Não pode. Pode ajudar a não ocorrer exatamente daquela forma, mas não existe a certeza da infalibilidade do seu método. 

Esse é o grande erro que cometemos, pensar na vida com um palco e que nossos atos terão algum reconhecimento ao final. Além disso, nunca seremos julgados pelo que fazemos, mas pelo que deixamos de fazer. 1000 SIMs não tem fazem uma boa pessoa, mas com certeza, 1 NÃO te faz um péssimo ser humano aos olhos dos outros. Nossas carências não podem nos fazer escravos da expectativa de recompensas afetivas que, muitas vezes, não vêm e alimentam frustrações decepções.

Faça as coisas por que elas são boas e devem ser feitas, ignore qualquer recompensa, pois a maior delas é saber que fez a coisa certa.


domingo, 5 de setembro de 2021

Procrastinar é normal, mas...

Essa palavra se divide em 3 partes maiores: pro (movimento a/em direção a, no sentido de), cras (advérbio que significa "amanhã") e demais são afixos formadores de verbo. Ou seja, grosso modo, significa a ação de mover algo que deveria ser feito hoje para amanhã e assim indefinidamente. No dicionário resume-se assim: ato de transferir para outro dia ou deixar para depois; adiar, delongar, postergar, protrair. Para alguns religiosos, chega a ser um pecado associado à preguiça.

Temos que encarar que todos são passiveis desse mal, e, eventualmente, a gente fica adiando para depois e depois uma coisa que inevitavelmente deve ser feita. Normalmente, se trata de algo que não nos dá prazer imediato e, como seres hedonistas (movidos pelo prazer) que somos, adiamos com foco inconsciente no prazer momentâneo de não fazer algo que não dá prazer. Ou seja, o prazer de "não fazer" vence o desconforto de ter que fazer algo que não nos dá prazer imediato. Entendeu?

Mas os efeitos são muito nocivos e o maior deles é o fator cumulativo. Se você não queria fazer algo porque não te dava prazer e adiou, quando você adia outra tarefa, agora, você tem duas coisas que não te dão prazer na lista e, um dia, você vai ter que encarar uma lista bem grande de coisas que não te dão prazer. Você só está adiando o desconforto e acumulando mais coisas desconfortáveis de serem feitas. 

Dessa forma, podemos entender que procrastinar é algo movido pelo prazer imediato. Entretanto, que, como efeito rebote, vai provocar o desprazer a longo prazo. É exatamente essa visão que nos move.

Nesse meio século de vida, aprendi que a melhor a maneira de trabalhar com isso são as listas de tarefas. Sempre no início de semana faço uma lista de tarefas separadas por áreas, trabalho, casa, saúde etc. E, na medida em que as coisas vão andando, vou riscando da lista. No início da outra semana, refaço a lista começando com a cópia das coisas que deixei de fazer e colocando-as em primeiro na nova lista com um ponto de exclamação na frente.

Isso ajuda a visualizar aquelas coisas que não consegui fazer ou que procrastinei mesmo e, na medida em que os pontos de exclamação vão se acumulando, aquilo vai virando uma urgência. Isso, nesses últimos anos, me ajudou a medir o meu PPH, uma sigla que criei para o meu Potencial de Procrastinação Humana. Hoje em dia, o meu desafio é lidar com o PPH dos outros, mas aí já é outra história.

Em tempo: procrastinei algumas semanas para escrever esse texto...rs Afinal, summus homines


sábado, 24 de julho de 2021

Política dos favores

Li certa vez que, um favor, vindo de algumas pessoas, sai mais caro que um serviço pago e me identifiquei com essa ideia já desde cedo. Eu preciso muito confiar no outro para aceitar um favor. Se não confio, prefiro pagar por um serviço, passar um aperto ou me virar, porque sei que a nota daquele "favor" serviço é uma fatura em aberto e sujeita ao que a pessoa acha quanto vale e como (e quando) vai cobrar.

Pessoalmente, acredito que uma das coisas mais feias nos relacionamentos humanos é o jogar na cara. E tem gente que bate no peito e diz: jogo na cara mesmo. Isso para mim é a perda definitiva de crédito afetivo e o caminho para saber que não posso contar com aquela pessoa. Afinal, nada é feito por camaradagem, afeto, amizade, mas simplesmente como sórdida moeda de troca.

O que nos move a fazer algo pelo outro deve ser antes de tudo o afeto e a certeza de saber quando nos doamos, nada perdemos ajudando o outro a crescer. Se isso é uma moeda de troca, segue a ajuda ao outro, mas o crescimento se ofusca no interesse sórdido. E o pior, cai naquela coisa de o que um fez pelo outro para quantificar em quem deve quem. Quantifica-se o inquantificável. 

Gosto mesmo é de gente gratuita porque sempre fui gratuito e, por mais que tivesse feito algo por alguém, jamais joguei, ou jogarei nada cara porque, no fundo, fiz por mim. Fiz porque queria ajudar porque julgava ser o certo naquele momento. Mas essa não é a máxima comum.

Enfim, aprendi a lidar com essas situações evitando ao máximo pedir ou viver situações em que se cria alguma dependência de quem quantifica afeto/generosidade/altruísmo. Isso, desde jovem. Reconheço que isso nasceu de várias decepções de ouvir pessoas falando: "nossa, mas eu fiz isso por você" e eu ficar pensando: Putz, eu não imaginei que estava pagando por um serviço… Juro que se soubesse que era um serviço preferiria pagar em dinheiro. Porque, afinal de contas, há favores que saem mais caros dos serviços pagos.

Pode ser radical, mas quando uma pessoa faz isso, algo muda em mim com relação ao que sinto e, certamente, quanto até que ponto posso contar com ela, afinal, se um dia eu não tiver mais moeda de troca, até onde irá a "generosidade alheia".


domingo, 11 de julho de 2021

E la nave va… toca o barco

Dizem, antes dos 20, se não somos revolucionários somos insensíveis e depois dos 40, se o somos, somos insensatos. Isso tem um fundo de verdade. Nesse período de 20 aos 40, a vida se encarrega de nos fornecer um choque de realidade e nos mostrar dia a dia que não é bem assim que a banda toca que as coisas não mudam no atacado, segundo a nossa vontade e nosso tempo. Sim. As coisas mudam, mas isso se dá no tempo das coisas e não no seu.

A verdade é que, nesse período, para a marioria das pessoas, chegam as contas, acumulam-se decepções (essas acumulam-se a vida toda), vemos que muitos rótulos de ideologias são bandeiras úteis para quem, no fundo, quer poder, dinheiro, prestígio e …. mudar o mundo? Não. Nem pensar. Ele não vai querer mudar o mundo logo na hora que conseguir se beneficiar das regras. Ninguém quer eu o bolinho acabe logo na sua vez na fila..

Acabamos depois de certa idade nos acomodando  numa tênue e confortável hipocrisia de saber que aquilo não funciona assim, mas muitos seguem sustentando um discurso que os legitima como alguém consciente, comprometido, engajado com algo nobre. Talvez, queiram mudar o mundo ainda, mas se envolve sair do sofá e do teclado do computador, vai se esperar um pouco. Afinal, em certa fase da vida, sabe-se o mundo vai mudar no fluxo dele e não no seu.

Muito poucas são as pessoas rompem essa inércia quase absoluta para mudar qualquer coisa, esses snao espíritos sui generis, pontos fora da curva. Não é a regra. A miséria do mundo a incomoda, mas os sem teto de sua cidade, seguem nessa miséria, mas essa não incomoda. Só a do mundo. Essa não, essa é culpa do estado opressor capitalista conservador.

As injustiças e desigualdades causam horror, mas se não te toca, tudo bem. É só um cartaz numa passeata eventual contra o sistema ou um discurso cheio de clichês. Voltamos todos para casa e postamos imagens no Facebook e Instagram para que vejam como somos politizados e do bem.

A corrupção enoja até que você ou alguém próximo querido (sua mãe, por exemplo) receba um cargo de um político corrupto e se beneficie disso. Afinal, se você não aceitar, outro vai aceitar. E de dentro do sistema você consegue agir melhor contra ele. Mentira… e não são sinceras. Logo, não me interessam.

Assisti a um filme outro dia chamado Um Bom homem (direção de Vicente Amorim e roteiro de John Wrathall) 2008 que conta a história de um professor que se vê no dilema de usufruir benefícios de um sistema com o qual não concorda (o Nazismo da Alemanha nos anos 30). Não vou dar spoiler, mas é fácil imaginar que rumo essa história leva.

O fato é que não se atenta contra o próprio status quo. Isso é humano. Queremos que o mundo mude, mas não queremos que mexam no nosso queijo. São muito poucos aqueles que se encontram dispostos a abrir mão de algo que afete o seu padrão de vida em nome de igualdade, justiça social etc.

Enfim, a maioria das pessoas quer um mundo melhor mesmo, mas não querem agir no varejo para melhorar esse mundo, querem um mundo mais justo, mas não estão dispostas a comprometer o seu padrão social, querem resumir toda a mudança a uma gritaria eventual, muitas vezes, paga em passeata ou ao clique de uma tecla.

Mas enfim, como dizia Terêncio (163 d.c) Homo sum; humani nil a me alienum puto, ou seja,  Sou humano, nada do que é humano me é estranho.

E la nave va… toca o barco


domingo, 4 de julho de 2021

O mundo não muda no atacado

Quando somos jovens queremos mudar o mundo no atacado, de uma vez, em um golpe só. Achamos que basta nos unir que tudo vai mudar porque unidos somos mais fortes. Só esquecemos de perguntar se o outro quer se unir a nós e desconsideramos que pessoas possuem interesses diferentes, realidades diferentes e nem todo mundo está disposto a comprar nossa proposta para um mundo melhor. Pessoalmente, tenho muito medo de propostas que apresentam uma supervalorização do coletivo seguida da anulação do indivíduo.. Isso é problemático demais e arriscado demais.

Pois é.. a maturidade nos ensina que o mundo só muda no varejo. No fundo, sabemos disso intuitivamente, mas mudar o mundo começando a mudar a si mesmo é muito complicado e desgastante. Tudo isso implica em mudar condutas, pensamentos, atitudes cotidianas que mudam  efetivamente nosso mundo e, como nosso mundo faz parte de um universo de mundos. Automaticamente, muda o mundo.

Muita gente se pergunta como lidar com aquele que não quer mudar a si a mesmo e sua resistência mantém esse universo de mundos em desarmonia. Primeiramente, tudo se encontra em movimento e de alguma forma, até quem não quer mudar muda sim. Não no ritmo que desejamos, mas muda. E, em segundo lugar, a velocidade dos movimentos em direção às mudanças ocorre no ritmo do livre arbítrio de cada um e não segundo nosso desejo. Respeitar o tempo do outro é parte da nossa evolução também.

As ideologias que pregam as mobilizações e a supremacia do coletivo acreditam de verdade que as coisas mudam na base do tranco. Isso é um engano e gera uma legião de pessoas que assumem para si a missão messiânica de mudar o mundo convencendo o outro a mudar mundo… que irá convencer outros a mudarem o mundo. Isso é inócuo e, olhando de perto não faz o menor sentido. O mundo muda com 1% de ideias e 99% de atitudes. E muita gente não consegue sair do 1%.

Eis a razão pela que se engajar na luta pelas crianças desnutridas da África é mais interessante do que pelas crianças em família que passam por necessidade na periferia de sua cidade. A indignação rende discursos, textos no Facebook, vídeo curtos com o celular na vertical e morre ali. Não demanda ação alguma. Miseráveis de longe são ótimos para a promoção do marketing pessoal nas redes, já os da periferia custam tempo, dinheiro e estão perto demais da nossa realidade, longe demais das redes sociais.

Uma vez conversava com um colega me dizia que essas campanhas de alimento e agasalho, por exemplo, não resolve porque milhões de pessoas ainda seguem sentindo fome e frio (daí ele não ajudar em nada). Era assistencialismo barato da burguesia capitalista. E eu perguntei: Mas não ajuda a reduzir a carência da pessoa beneficiada? E ele respondeu: É... mais o problema ainda está lá no sistema.

Moral da história: se não for para mudar o mundo todo de uma vez, não faço nada. Se não for para beneficiar 100%, não faço nada para ninguém.

Ele não entendeu que o mundo não muda no atacado mesmo… ou entendeu.



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domingo, 27 de junho de 2021

O que vejo e o que as coisas são

Nietzsche dizia que não temos acesso à verdade dos fatos, mas a narrativas. Mesmo aquilo que presenciamos, uma vez registrado no nosso universo de informação se torna uma narrativa e todas as vezes que retomamos o fato presenciado, retomamos a narrativa construída por nós mesmos. Sim.. Estamos diante de uma intangibilidade da verdade pura e uma multiplicidade de narrativas. Coisa doida, né? Pois é.

O fato é que enxergamos o mundo através de lentes que só permitem a visão do que elas filtram. Lentes formadas por nossa experiência pessoal, nossa formação cultural, nossos interesses pessoais e uma infinidade de fatores que me levam a crer que não enxergamos o mundo necessariamente por aquilo que queremos ver (como pensei muito tempo), mas por aquilo que conseguimos ver.

Assim como no livro O mágico de Oz (The Wonderful Wizard of Oz - romance de L. Frank Baum) que virou filme, em que havia a cidade das esmeraldas porque o mágico obrigava que todos usassem óculos de lentes verdes, vejo que, muitas vezes, o que as pessoas veem é aquilo que surge através de óculos verdes e acham que toda cidade é feita de esmeralda mesmo. 

Isso ajuda muito a entender a cegueira ideológica que temos hoje. Os radicais de esquerda, que, no fundo, são iguais aos radicais de direita, uma vez que são duas faces da mesma moeda, enxergam o mundo através de lentes muito pessoais e constroem narrativas que atendem ao conjunto de verdades que escolheram com base naquele mundo que conseguem enxergar. Aliás, um mundo pleno de uma lógica pessoal, própria e conveniente.

O meu medo é que, no desconhecimento dos óculos que carregam no rosto e que distorcem o mundo para caber nas suas crenças, os limites se esvaiam e as ações passem a ter o fim como justificativa suprema um bem maior. Os nazistas acreditavam nisso, os fascistas acreditavam nisso, Mao Tse tung acreditava nisso, os comunistas acreditavam nisso, todos traziam a certeza de estarem agindo pelo bem comum lutando por um mundo melhor. Os óculos que usavam só permitiam ver isso..

Podemos encerrar a discussão se nazismo é de direita ou de esquerda dizendo que, na verdade, no sentido metafórico da palavra (governo autoritário, opressivo, violento, ditatorial etc) ele é dos radicais de ambos os lados que seguem enxergando o mundo pelas suas lentes e elegendo como inimigos aqueles que não aceitam ver as coisas como eles veem. Isso gera inclusive, hoje em dia, o ódio ao "isentão", que é o nome que dão aquela pessoa que não quer assumir a ideologia dela. Já expliquei isso aqui no blog.

Abrir mão desses óculos de ver o mundo  nu e cru é quase impossível, mas é importante saber usar lentes multifocais e entender que o mundo não é um produto, mas um processo e sendo assim, nunca vemos o como É, mas o como ESTÁ.


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