sábado, 19 de maio de 2012

Memórias de um idiota confesso


Durante muito tempo na vida, achei que trabalhar de segunda de manhã até as 18 horas de sábado era motivo de vangloriar-se. Contava isso com o peito cheio de orgulho e completava com coisas do tipo “não tenho tempo nem para almoçar, engulo qualquer coisa e pronto”. Sentia imensa satisfação em relatar que atendia mais de 20 telefonemas por dia e me faltava tempo para ir ao banheiro. (Ah... isso me rendeu problemas nos rins que tive que vir a tratar depois.)
Achava o máximo olhar uma agenda lotada e terminar o dia com ela mais lotada ainda. Num ato de extremo desprendimento em nome do comprometimento profissional, dizia que mal via a meus filhos durante a semana... E isso era o discurso daquele que se sacrifica em nome do conforto (entenda dinheiro) para família.
Um dia alinhei os baldes e saí chutando. Comecei a bater de frente com tudo que me violentava e com todas as conivências com as quais não mais estava disposto a conviver. Era uma maneira de interromper esse processo, pois como uma droga, eu já não conseguia mais largar. O resto se deu naturalmente.
Aprendi a duras penas que sacrifícios precisam de objetivos, que discursos servem para nos enaltecer e expressar uma abnegação que não temos, que objetivos nobres são desvirtuados por quem manipula aqueles que acreditam e, por fim, tudo que é ruim, tudo que te destroi, tudo e todos que representam um freio em sua evolução como ser humano precisam ser expurgados, extraídos.
Assim como o são os tumores. Não existe cirurgia sem dor, sem pós-operatório, sem resquícios... mas precisa ser feito.
Quando ouço alguém com o mesmo discurso que eu sustentava há uns anos atrás sempre penso:
- Seria tão bom se ele se livrasse dos seus tumores.
Mas só o tempo dá a cada um a dimensão de suas mazelas... só tempo.