domingo, 28 de março de 2021

Escravos de nossas escolhas

O fato é que o caminho que nossa vida toma seja ele bem feliz ou uma desventura absoluta é resultado de nossas escolhas. (imagino que seja duro ler isso quando nessa altura da vida já encontramos todos os culpados que precisávamos para nos isentar de responsabilidade). É claro que, diferente do que querem alguns resumir a condição do homem ao meio em que ele cresceu e as regras da sociedade em que vive, uma reedição infantil do determinismo, somos sim, resultados de nossas escolhas e onde estamos é o resultado de um monte de caminhos que optamos.

O que, de forma alguma, descarta que as escolhas foram movidas por interferências do meio, do momento, de nossa criação, das pressões sociais, sim. Mas nossa história não deixa de ser resultante de uma escolha nossa. Dizer que não temos escolha é uma das maiores falácias do reducionismo comportamental. O que não estamos dispostos é bancar a opção preterida por inúmeros motivos, dano maior, desgaste, desinteresse, imediatismo etc.

Acontece que uma escolha cria cenários e momentos que acabam influenciando (eu disse influenciando e não determinando) nas outras escolhas que se seguem. Lembra da série Breaking Bad? Quem assistiu vai lembrar. As escolhas de Walter White começam a se interligar em contexto e relações. Em um momento, quando se espera que ele vá fazer um discurso de vitimismo do tipo fui impelido pelas circunstâncias, sou uma vítima do sistema, fiz isso porque envolvido em representações sociais que me impeliram a blá, blá, blá… Ele olha nos olhos de sua mulher e diz: sabe por que fiz isso? Por que eu quis. A seguir, ele explica porque ele quis.. item por item.

Mas aí é que está o nível de dignidade e lucidez do personagem. Ele assume as rédeas de sua história e diz: estou nesse lugar porque ele é o resultado de minhas escolhas que, por conseguinte, são o resultado do meu livre arbítrio. Ele poderia ter dito, eu fiz isso porque me sentia diminuído, fracassado, porque tinha câncer, porque queria dar uma vida de fartura a minha família… Mas não. Eu fiz isso porque eu quis. Eu fiz por mim. Assumir um certo egoísmo e a responsabilidade é de uma dignidade e hombridade quase divinas e extremamente raras.

É exatamente isso. Isso é assumir-se por completo e dizer que o seu destino (bom ou mal) é de alguma forma diretamente um resultado das suas escolhas. Onde você está é parte do caminho que você traçou até aí. Quem te traiu, te roubou, te prejudicou, tentou te destruir era parte desse caminho. Tem a cota de responsabilidade deles e você se tivesse escolhido outro caminho haveria outras pedras, não essas, mas outras. Não há caminhos sem pedras.

Todos travam uma batalha pessoal e, independente do caminho, haverá momentos de escolha e as escolhas nos direcionarão a um conjunto de escolhas em uma cadeia infinita que pode ser quebrada, mas obviamente não é simples. Nunca é fácil essa ruptura nem resolve o problema das pedras no caminho e em outras escolhas. Não existe saída desse Samsara, esse ciclo de morte, renascimento… e escolhas.

Sem receita de bolo, sem soluções mágicas, somente com a percepção de que não há como fazer dar certo, porque não existe o certo nesse caso. Há caminhos e encará-los como eles são e nos assumirmos como responsáveis por estarmos ali é a maneira mais saudável de doer menos. Sim. Sempre vai doer, a dor pertence ao mundo, mas nem sempre vai ser sofrido, porque isso já pertence a você. Doer vai, sofrer é você quem escolhe.


***

Hesitei em escrever esse texto porque de certa forma soa acintoso contra tudo aquilo que encontramos na nossa vida para colocar culpa e atribuir nossos fracassos. Inclusive os meus fracassos e os meus culpados devidamente eleitos e embasados em uma lógica impecável e pessoal.