sábado, 23 de abril de 2011

Democracia tutelada é a mais escrota das ditaduras


Eu assistia a um documentário outro dia no History Channel sobre as democracias tuteladas da america latina. Achei essa terminologia ótima para se referir a uma ditadura negociada. Se é que se pode dizer que isso exista mesmo. Tenho cá para mim que ditadura é ditadura e ponto final. Muitas se disfarçam de estados legítimos democráticos, mas se valem do poder econômico para perpetuar o poder. Um exemplo que me chama a atenção é a Venezuela.
Um líder que se elege a custo de poder econômico uma vez que detém a máquina do estado e dela faz o que bem entende, controla a impressa que considera golpista quando discorda dele (impressa golpista... parece que já ouvi isso por aqui no Brasil há bem pouco tempo atrás...) e assume uma postura de candidato a martir de um comunismo morto e enterrado há mais de 20 anos...
Enfim, não existe democracia tutelada. Democracia tutelada é ditadura legitimada.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Poucas coisas realmente importam

O problema é que percebemos isso tarde demais para não nos importarmos com o que não merece nosso desgaste. Outro dia, eu coçava a barriga do meu filho caçula (6 meses) com a barba e o fazia dar gargalhadas. Ele se revirava cada vez que eu fazia barulho com a boca e coçava sua barriga com a barba.
Veio-me este pensamento de súbito. Quando nascemos o que nos é importante é tão básico, tão restrito. Crescemos e desenvolvemos sentimentos de posse, de revanche, de onipotência e perdemos a dimensão de como as coisas que importam são tão poucas, tão próximas.
O que vi nessa vida de pessoas que vendem sua alma por coisas, que cultivam inimizades por orgulho, que compram brigas, batem no peito e dizem que dão uma boiada para não sair da briga como se aquilo fosse algo que valesse a pena, como se aquilo fosse uma virtude a ser cultivada. E desde quando estupidez é virtude? Gente que esquece que não somos um cargo, estamos num cargo e a noite em que estamos pode ser sempre a véspera da que saímos. Pessoas assumem crenças religiosas e políticas e por elas são capazes de brigar, discutir, até matar. Evocam para si a missão de mudar o mundo convencendo as pessoas de que elas estão certas, plenamente certas. Esquecendo o quão desimportante é estar certo em 99,9% das vezes.
Tudo isso por que um dia perdemos a noção de que o que importa, de verdade, é muito pouco.

sábado, 16 de abril de 2011

O bom blefador, a arte de vender o peixe

Se tem uma coisa que eu admiro é um bom blefador. Desde que decidi calar para entender melhor o mundo que me cerca, comecei a ver a admirar esse dom sórdido, mas fascinante. O que mais me encanta, por assim dizer, é a convicção do que se afirma. Consultores são mestres geniais nessa arte. Eles afirmam fatos e dizem que não podem dar mais detalhes pois envolvem outros clientes. Isso encanta, pois ao mesmo tempo que passa o domínio de um saber mágico e misterioso, impressiona pela dimensão ética da atitude dele. Genial, dois pontos numa tacada só.
Essas e outras estruturas de discurso são altamente eficazes. Além de o fato de o blefador contar a seu favor com dois fatores: o seu histórico é desconhecido porque ele vem de fora da instituição, logo, isso o habilita a ter razão em tudo que disser; segundo, sua propaganda chega sempre muito antes dele junto com um cartão que traz coisas como Fulano e Beltrano, consultoria e projetos.
Convenhamos. Veja a credibilidade de alguém que não é do local e ainda traz um cartão escrito consultoria e projetos ltda. Quem duvidaria de alguém com esse currículo. Se ele vier de um grande centro (Rio ou São Paulo), então, temos alguém habilitado para tudo. Um gênio de visão empresarial impressionante que desce do Olimpo para nos deixar sorver de sua sapiência infinita.
Ó, pensamento provinciano, mesmo depois de séculos, por que não nos abandonaste?


quarta-feira, 13 de abril de 2011

Fuçar no nariz e outras esquisitices: tudo normal

Lembro que, na época da Copa de 2010, causou um grande furor a imagem de um técnico (acho que da Alemanha) tirando meleca do nariz. Foi um frisson terrível, “Olha, ele tirou meleca!”, “Nossa, ele tem meleca no nariz”, “celebridades têm meleca...” Aí, um dia, eu questionei dizendo que todo mundo tem meleca, todo mundo tira meleca... Logo, fui rebatido com um “Nossa, mas na frente de todo mundo? Que nojeira!” 
Bom, deixa eu entender. Quer dizer que meleca na frente dos outros é nojeira. Fechou a porta do banheiro, tirou meleca não é mais nojeira? Dizem que o cara comeu depois.. isso é também outra questão. Sei lá...
Outra coisa foi a questão Sandy no Carnaval. Houve uma indignação coletiva de vê-la como garota propaganda da cerveja Devassa. Tudo bem, eu preferia a Paris Hilton até pelo seu currículo com direito a vídeo na web e tudo mais. Entretanto, gente, a ideia é “todo mundo tem um lado Devassa”. Vai que até gente como a Sandy tem. Achei legal. Criaram em torno da Sandy uma aura de pureza.. sei lá. Vai que ela é normal como todo mundo e além de fazer cocô, xixi, arrotar e soltar pum, ela tem um lado devassa e curte menage a trois, sexo grupal, exibicionismo, lesbianismo, ver vídeo pornográfico hard core... sei lá.. Vai saber.
Afinal, todo mundo tem um lado devasso mesmo que, por mais que se esconda, acaba surgindo sorrateiramente, ainda que seja depois que se fecha a porta do banheiro.


sábado, 9 de abril de 2011

Uma história cabeluda

Zenilda comprava creme, fazia escova, hidratação e tantas coisas mais para ficar com o cabelo liso e brilhante. A natureza lhe fora injusta e, por causa disso, gastava quase todo seu ordenado com a manutenção de um estado apresentável de seu cabelo. O marido não podia fazer-lhe cafuné,  chuva a apavorava mais do que um tiro e uma estranha toca lhe protegia durante o sono de algum amassado ou suor incomodo que botasse a perder as horas de tratamento.
Um dia, em frente a seção de xampus, ela lia o que vinha escrito na parte de trás da embalagem de um deles: Xampu para cabelos crespos, tingidos, quebradiços, ressecados, com pontas, queimados pelo sol, opacos e danificados produtos químicos....
Era esse o shampoo com que ela tanto sonhara....
Mais abaixo, um recado em letras muito pequenas, quase imperceptíveis....
Tem certeza que vale gastar esse dinheiro com um cabelo nesse estado?

quarta-feira, 6 de abril de 2011

A flexibilidade moral e os canalhas de ocasião

Outra dia eu assistia a um filme interessante, Obrigado por fumar (quem não viu, veja!) em que um indivíduo que chefiava o lobby da indústria de tabaco nos EUA vive entre defender o indefensável e a convivência com o filho que começa a construir valores que levará para toda vida. O que me agrada nesse filme é o seu tom nada moralista e sem os finais previsíveis das histórias edificadoras do cinema puritano de alguns diretores americanos. Em determinado momento o filho pergunta ao pai como se pode fazer o que ele faz e se ele (o filho) seria capaz de fazer o mesmo. O pai o responde dizendo que é necessário haver uma certa flexibilidade moral para exercer sua profissão. Essa foi a maneira mais sutil de se referir à falta de caráter que os interesses pessoais nos projetam. Justificar seus atos com a flexibilidade de conceitos inflexíveis é, no mínimo, amoral. Mas não imoral. 
Há coisa na vida que não comportam o meio termo e essa é uma dessas coisas. É como aquele famoso jeito de dizer... “Ele é meio gay”. Desculpem. Mas não dá... Ou melhor. Dá mais não se assume. 
Todos somos canalhas de ocasião, agimos como canalhas em um momento outro da vida e, quando temos o discernimento, procuramos que isso seja a exceção e não a regra de nosso comportamento. Isso sim, nos torna mais humanos e nos dispensa de encontrar em nós uma moral que se flexibiliza e nos torna menos ordinários.  
É como naquela música em que se diz que “quem se diz muito perfeito, na certa encontrou um jeito insosso para não ser de carne e osso”. Afinal de contas, somos humanos e nada do que é humano nos deve ser estranho (Terêncio)

sábado, 2 de abril de 2011

Uma franquia dos infernos

Pensava o Diabo uma maneira de ampliar os seus negócios na terra.  Reunido com sua equipe de demônios-assessores ouviu um deles dizer que o negócio agora era o mercado de franquia. Entretanto, criar uma franquia com a marca Satanás não seria uma boa, o nome está gasto, a marca está batida e mal afamada. O negócio seria criar contratar uma franquia que tivesse boa aceitação. - Jesus... Disse um deles. - Vire essa boca para lá, rapaz. Rebateu outro demoniozinho assessor.
- Não. Ponderou o Tinhoso. Sabe que é uma boa ideia. O investimento inicial é pequeno, não paga imposto, a matéria prima do que se vende é gratuita e, normalmente, quem compra, vai por impulso ou desespero. Não pensa, por que se pensar demais não compra.
- Mas chefe, já existe essa franquia, observou um advogado do diabo.
- E daí, abrimos, espalhamos, captamos dinheiro e eles que entrem na justiça.
- No caso, a divina, não é? Completou um capetinha trainee.
- Que seja!
O negócio prospera a olhos vistos em cada esquina.

Enquanto isso o processo de uso de imagem movida pelo céu rola na justiça eterna.

quinta-feira, 31 de março de 2011

O mundo todo evolui, menos máquinas de fliperama

Estive com meu filho de 3 anos outro dia em um fliperama de shopping, coisa que já havia um bom tempo eu não fazia. Ele ficou encantando com as máquinas de carrinho, sentou, mexeu no volante, passou marcha, mas não conseguia alcançar os pedais. Ainda assim, divertiu-se bem ao seu modo. Com ele distraído, tive a oportunidade de prestar atenção que praticamente todas elas eram daquela marca Konami ou Sega e datavam de 1994, 1995.. A mais atual era de 1999. Aos poucos notei que os gráficos eram barbaramente toscos com os pixels a vista, som de baixa qualidade, tudo em uma tela de 29 polegadas das TVs antigas. E tinha uma galera na fila para pagar 2,50 para jogar uns 3 minutos naquilo. Fiquei  pensando o que leva essa galerinha da geração PSP3 brincar com aquele game jurássico. Talvez a mesma coisa que leve a pessoas da geração mídia digital a comprar discos de vinil, Saudosismo. 
No caso do meu garotinho, é o desconhecimento de que há um mundo mais interessante do que aquele monte de pixels tosco numa tela velha de TV...

P.S.: Mas sabe que deu saudade do meu Atari...


quarta-feira, 30 de março de 2011

O homem do amendoin e as oportunidades

Outro dia, eu me encaminhava para o meu médico em Volta Redonda, mas como tinha ainda uns 20 minutos para dar a hora da consulta. Logo, eu resolvi passar em uma lanchonete para comer um salgado ou algo assim. Comi meu salgado e, quando me dirigia ao caixa para pagar, senti alguém que tocava em meu braço e falava algo enrolado. Virei-me para ele e percebei que era um rapaz de seus 20 e poucos anos mais ou menos. Aparentemente, ele sofrera um tipo de paralisia cerebral que o deformara bem. Sua aparência era feia e sua voz confusa. Tocava com um saquinho de amendoin em meu braço e pedia para que comprasse um para ajudá-lo. Recebi o troco e dele retirei 50 centavos para o rapaz. Afastei-me. Olhei para trás e o vi tocar em outras pessoas pedindo o mesmo. Trajava roupas rotas e um pouco sujas. 
Abri o saco de amendoin e cada vez que comia um, pensava sobre o que a vida havia dado àquele homem. Um saquinho de amendoin que, possivelmente, ele comprava por 20 centavos e vendia por  50 para ganhar 30 centavos por saquinho. Cada amendoin me dava a dimensão do que a vida havia dado a ele. Um saquinho de amendoin e um mal que só a morte aplacaria.
Contei essa história a uma aluna de Medicina que se dizia desestimulada a estudar e queria trancar. A aluna, uma mulher de seus 30 anos, muito bonita, com excelente situação financeira, saudável, inteligente...
Ao final da história, ela chorou... ela entendeu que a vida não havia lhe dado somente um saquinho de amendoin.
O homem do saquinho de amendoin tinha cumprido sua missão e, agora, devia estar tocando outro braço oferecendo amendoin sem saber que havia tocado um coração há quilômetros de distância.