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domingo, 16 de agosto de 2020

O que vale a pena, seu Tião?

Hoje, lembrei de uma história que me ensinou muita coisa com uma imagem.
Quando era pequeno, talvez uns 8 anos, minha avó me levava eventualmente para visitar um compadre e uma comadre dela. É assim que nos referimos na minha terra mesmo quando não existe um apadrinhamento, mas uma relação de carinho e família. 
Seu Tião, homem que outrora era forte, bravo, altivo, daquele que batia o pau na mesa e fazia valer sua vontade. Em tempos de mais novo fazia o gênero macho alfa dos anos 50. Mas que eu o conheci  quase no final dos anos 70 e depois de um derrame que o tinha incapacitado deixando-o em uma daquelas cadeiras higiênicas vestido com uma roupa como uma camisola. Sua esposa mantinha um penico embaixo e limpava sempre que saiam excreções. Por mais que limpasse, havia um odor de urina no ar que não ia embora. 
Sempre sentado reagia com quase espasmos que eram um arremedo de um sorriso ou algo assim com a língua quase o tempo todo para fora. Aquilo me impressionou e me impactou... foi a primeira vez que me defrontei com a vulnerabilidade de um homem e, nos meus 7 ou 8 anos, aquilo não fazia muito sentido. Seu Tião morreu alguns anos depois dentro de um corpo que definhava dia após dia, acompanhado da esposa que dava comida em sua boca e o limpava. Como não havia muitos recursos na época, seu definhamento deve ter sido muito mais doloroso. Estar com uma consciência presa dentro daquele corpo vegetal morrendo devagar por anos.
Aonde eu quero chegar?
Muito anos depois, me vi em uma disputa como diretor em uma instituição que me desgastava demais e, durante alguns segundos, tudo aquilo me pareceu completamente dispensável. Veio-me à mente a imagem do Seu Tião, seu definhamento, o cheio de urina, seu sorriso com a língua para fora e seus olhos desorbitados... Nesse momento, deixei a disputa para a incompreensão de todos, pois até ali eu era parte do processo, só que tive uma dimensão do essencial que nunca havia tido antes.

O fato é que a gente perde completamente o que é essencial da vida mesmo e se envolve em lides que, muitas vezes, vão nos trazer desgaste de energia e benefícios pífios. Uma energia que se perde e um benefício que não compensa.

Ainda vejo no meu trabalho, colegas mais novos, queimando sua energia vital para nada, aderindo a grupos em busca de legitimação quando já são bons profissionais, mas não se dão conta disso. Travando imensas lutas com moinhos de ventos. Morrendo aos poucos por causas perdidas...

Lembro da música do Lupicínio Rodrigues "esses moços, pobres moços, ah se soubesse o que eu sei..." e penso quanta coisa EU ainda não sei. Só que a diferença é que, hoje, eu sei MESMO que não sei e isso me faz baixar muito a bola. Eles não sabem, mas acham que sabem e sustentam um discurso de falsa humildade de "nada sei", mas quero o melhor... Melhor para quem?

É tão confuso que eles não sabem, dizem que "sabem que não sabem" (para expressar pretensa humildade e nível de conhecimento pessoal elevado sobre si mesmos), mas não sabem nem isso "que eles não sabem". Então... entendeu? Sei.. é difícil.

Ah, esses moços, pobres moços... que um dia Seu Tião os visite na metáfora que me visitou.







terça-feira, 6 de setembro de 2016

Nossa adorável ignorância

Certo dia, eu conversava com um conhecido bem mais novo do que eu e dizia que com o tempo a gente tem muitas das certezas desfeitas, contava a ele, advogado recém formado, que a realidade nos dá um choque e desmonta tantas teorias que temos quando mais novos...
Bem típico da geração mais nova que exige o direito de falar, mas entende o dever de ouvir como um ato opressor de uma elite dominante (e blá, blá, blá...mimimi), ele ouvia com ar de enfado enquanto eu, estupidamente, perdia o meu tempo falando coisas que ele só entenderá em uns 15 ou 20 anos.
Eu contava para ele que as certezas se desfazem de uma forma absurda e nos sentimos um pote de dúvidas.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

A mais difícil de todas as aprendizagens


Tenho aprendido a duras penas a ter paciência e, nessa aprendizagem, tenho contemplado melhor um monte de coisas que passam despercebidas a todos nós. Preocupamo-nos em aprender um ofício, uma lida, um conteúdo, mas tudo isso requer a aprendizagem primeira da paciência. Requer entender que tudo tem seu tempo e o que mata é a ansiedade.
O que mata é morrer de véspera com aquilo que ainda nem aconteceu. É sofrer por antecedência  com coisas que, muitas vezes, nem vão acontecer, mas que, na nossa cabeça, fazem parte de um planejamento e de uma visão de futuro que não temos. Mas insistimos em ter... é. Não temos isso.
Aprender a viver um dia de cada vez tem sido a minha mais difícil aprendizagem. A luta para entender que cada dia tem o seu mal. E basta. Não traga o mal de outros dias para hoje. Temos que entender que o amanhã cuidará de si mesmo.
Aprendi duas línguas além da minha língua mãe, aprendi a ser professor, fiz um mestrado, um doutorado, aprendi inúmeras coisas eu doeram menos do que aprender que os dias são unidades que se sucedem uma após outra e não dá para sofrer antes do dia de amanhã, porque ele chegará com suas dores e alegrias.
Tudo isso, na inexorável velocidade de 60 minutos por hora.
Queira você ou não.

sábado, 6 de setembro de 2008

Quando somos adolescentes achamos...

Quando somos jovens, trazemos conosco a certeza de que aquela menina linda e supersensual da escola não sai com a gente só porque não temos carro, não temos dinheiro, não temos condição de levá-la a um local que preste para comer algo e bater papo. A maturidade é sábia e nos traz a percepção de que tudo aquilo que acreditávamos, no fundo, era verdade. A maturidade nos faz perceber que se fôssemos mulher e nos olhássemos naquelas circunstâncias não teríamos razão nenhuma para sair com a gente. E não venha com o papo de riqueza interior. Imagina:

-
A conta é de 65 reais. Apresenta o garçom.
-
Olha seu garçom, dinheiro eu não tenho, mas sou uma pessoa excelente, de caráter, honesta, sincera... espero que o senhor leve isso em conta. Ou melhor.. leve à conta isso.

E a história termina com seu pai o pegando na delegacia. O silêncio no carro de volta para casa vai traduzindo a vontade que seu pai tem de estrangulá-lo por causa da vergonha que o fez passar.
O caso é que achamos que, quando formos adultos tudo vai melhorar, mas não sabemos que , quando chegarmos a idade adulta, passaremos achando que tempo de curtição era a adolescência.
Aos 16, achamos que ninguém nos entende e que o mundo não é justo. Quando adultos, temos certeza disso. O mais legal é que, aos 16, não se imagina como essa certeza é confortante.
Quando somos
teens, os pais pagam nossas contas e achamos que não fazem mais do que sua obrigação, quando adultos, pagamos nossas contas e os credores têm a certeza de que não fazemos mais do que nossa obrigação. Porque, de fato, não o fazemos mesmo.
Aos 18, temos a certeza de que vamos mudar o mundo nem que seja a porrada. Aos 37, descobrimos que o mundo nos deu tanta porrada que nós mudamos.
Passamos a vida substituindo dúvidas por certezas e estas por outras dúvidas... a graça da coisa está aí.
Pelo menos, é o que acho até agora... Deixo aberto para minhas futuras mudanças de opinião. Esta crônica é uma obra em aberto... Amanhã, acho outras coisas e assumo novas certezas.
Até amanhã.

sábado, 9 de agosto de 2008

Apelidos e fases da vida

O fato é que quando somos adolescentes, nossos amigos têm apelidos que se dividem em algumas categorias distintas: os apelidos alimentares (o Farofa, o Pipoca, o Angu, o Biscoito, o Geléia etc), existem os “partes do corpo" (o Orelha, o Boca, o Coxa, o Barriga etc), existem os escatológicos (o Meleca, o Arroto, o Cocô, o Flato... e vai por aí). O fato é que todos guardam um segredo mortal, pois em casa tem um apelido dado pela mãe ou pela irmãzinha mais nova que depõe contra sua reputação e faz com que opte por ser conhecido o Orelha e não como Titinho (de bonitinho.. Sabe quando era pequeno? Pois é, era até engraçadinho... Mas, aos 15 anos, ser chamado assim é a queimação de filme suprema).
Quando se é adolescente e sua mãe pergunta quem vai ao lugar que você quer ir:
- Ué, mãe, vai eu, o Geléia, o Meleca e o Barriga...

A mãe aceita resignada porque conhece e sabe que são filhos de conhecidos, bons meninos. E ainda retruca:

- Ah bom... Tudo bem. Não quero saber de você andando com o tal de Arroto e do tal de Pipoca.

A realidade é que quando crescem viram sobrenome em uma repartição (o Almeida, o Silva, o Andrade, o De Paulo, o Oliveira etc) e deixam para trás os apelidos bizarros. Olhando assim meio rabo de olho, ninguém suspeita que, hoje, o sério Almeida, chefe do RH, era o Meleca de outrora, ou que o Silva atendeu pela alcunha de Farofa...
É...
E o Pipoca virou meu chefe...
Se o Arroto não tivesse sido preso minha mãe tinha errado 100% no seu julgamento. O Arroto não prestava mesmo.