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terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Central do Brasil e o país de escrevedores


“Digo isto porque tenho medo que, um dia, você também me esqueça...”
Dora, personagem de Fernanda Montenegro no filme Central do Brasil.

Outro dia revi Central do Brasil e penso como é que não foi daquela vez que trouxemos o Oscar para Brasil... Para mim, é a obra de arte do nosso cinema, sinal de amadxurecimento nessa arte jamais visto antes.
Entretanto, ele é o ponto de partida de uma série de reflexões sobre o país que temos e o país que queremos. Central do Brasil foi a grande demonstração de amadurecimento do cinema brasileiro, mostrando que dos arroubos do Cinema Novo, das inovações e óticas engajadas de Júlio Bressani e Glauber Rocha entre outros, brota um cinema maduro, bonito e sensível que constrói a apresentação de nosso perfil cultural ao mundo de maneira clara, lúcida e cada vez menos estereotipada (Não tem mulatas sambando de biquini, homens jogando futebol, baianas rodando a saia e vai por aí).

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Vou estar fazendo- anatomia de um vício

No meio do meu descanso toca o telefone.
“Boa tarde, senhor (atentem ao ‘r’ vibrante). Aqui é da Mega Plus International que por sua boa relação como cliente vai estar disponibilizando totalmente grátis sem nenhum custo adicional o Ultra Mega Plus Card com todas as vantagens do programa especial Mega Plus Services, vai estar também oferecendo (por favor, com uma epêntese do /i/, logo, ofereceindo)...” Pronto, já me perdi no gerúndio desnecessário dela.
- Obrigado pela oferta, mas não vou estar quere(i)ndo.
- Mas senhor... Insiste. Mas que vantagens o seu cartão já oferece...
- Não oferece vantagem nenhuma, mas o que rola entre a gente é uma relação sem interesse, é só amor mesmo...sabe aquele não querer mais que bem querer de Camões.
A atendente de telemarketing se despede, mas não sem antes rir do outro lado da linha.
O fato é que o gerúndio é uma forma nominal em português que projeta o aspecto durativo em um evento verbal. Eu estou escrevendo é uma maneira de dizer que no momento atual (que não é necessariamente agora) eu estou exercendo a atividade de escrever. Sendo assim, é uma aplicação aspectual muito pertinente ao tempo presente e a casos de formas de pretérito (Ontem, eu estava escrevendo quando...), mas não muito necessária ao futuro. Na verdade, é até dispensável.
Não vamos fazer um cavalo de batalha com isso, mas de uns tempos para cá algumas modalidades de discurso como o telemarketing exauriram este emprego do gerúndio assim com em certas épocas outras modalidades desgastaram termos repetidamente como “a nível de”, “eu, enquanto, X” e outras pérolas que pareciam (?) dar ao usuário um ar de intelectualidade.
A bola da vez é o gerúndio. Podemos argumentar que é uma tradução mal feita do inglês (I´m going to be offering / vou estar oferecendo) ou mesmo que, de fato temos uma ação durativa no futuro. Entretanto, o fato é que muitos verbos indicam que o evento será realizado em um ponto no tempo (vai oferecer, por exemplo. Você oferece em um momento e ponto e não faz disso um processo que se estende). Por outro lado, o gerúndio se aplica bem em casos como “Amanhã, a esta hora, vou estar falando para mais de 100 pessoas. O verbo falar esta modulado por um gerúndio que aponta nitidamente para uma ação de discursar.
Aos operadores de telemarketing, sugiro a substituição por um presente com valor atemporal (a Mega Plus International oferece ao você, sem nenhum custo adicional...). Diriam eles que isso é menos expressivo do que o gerúndio. Mas aí eu pergunto: Por quê? Tecnicamente, é até mais amplo.
Enfim, fica aí a sugestão.
Da próxima vez, com certeza vou estar sugerindo isso..
Viu como fica esquisito?

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Presidente ou presidenta? Dilma será o quê?

Alguns órgãos oficiais, que nem de longe podem ser denominados autoridades para falar sobre Língua Portuguesa, se apressam em emitir as opinões mais estapafúrdias possíveis se valendo em argumentos que, longe de embasarem a teses, provocam risos nos estudiosos do idioma.
O fato é que presidente é um substantivo cujo gênero pode ser definido como Comum de Dois, ou seja, prestam-se a definir tanto ao sexo masculino como feminino mudando-se apenas o seu dêitico (artigo ou pronome que o antecede). Seguem estes exemplos palavras como dirigente, assistente, pedinte, contribuinte, presidente entre outros casos. Todos esses casos se assemelham em sua formação por serem compostos por um radical verbal (dirig-, assist-, ped-, contribui-, presid-) mais o sufixo –nte que indica aquele que exerce a ação de algo.
Dessa forma, não existe o termo presidenta, assim como não existe o termo assistenta, contribuinta, dirigenta, pedinta e outros. O fato de Dilma ser a primeira mulher presidente do Brasil não justifica a flexão já que outras mulheres foram dirigente, assistente, pedinte, contribuinte e nem por isso se fez necessária a flexão nominal de gênero onde ela não existe.
Mais uma vez, pipocam pessoas emitindo opinião sobre assuntos que desconhecem ou sobre o qual sabem muito pouco. O grande problema com relação à língua é exatamente esse, muita gente acha que, porque fala, sabe sobre ela.

Veja bem, eu, por exemplo, tenho dentro de mim um monte de órgãos que uso todos os dias, mas não me considero um especialista em nenhum deles e me sinto desconfortável em emitir opiniões técnicas sobre os mesmos.

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Em razão de alguns comentários agressivos, quero deixar claro que não me revoltei com o resultado das eleições, que não tenho nada contra Dilma Roussef, mas que gostaria de suscitar uma questão lingüística e não política. Sei que esse tema (política) mexe com paixões e resguardo-me o direito de publicar comentários que se atentem à discussão lingüística.


Prof. Marcelo Leite
Doutor em Língua Portuguesa pela UFRJ