quarta-feira, 27 de junho de 2018

O professor e a bermuda

Outro dia eu tentava me dar conta de quando eu tinha despertado para o magistério como vocação. No meu caso sim, vocação. Não caí de paraquedas na profissão. Escolhi mesmo. Quis ser professor, estudei para ser professor, investi na minha carreira como professor. Lembro o primeiro dia em que entrei em uma sala de aula como profissional de educação e ficava pensando: gente, isso é bom demais e ainda me pagam para isso!
Não me arrependo das escolhas profissionais que fiz ainda que tenham ocorrido os percalços naturais no meio do caminho. Afinal, sempre há pedras no meio dele. Hoje, beiro o meio século de vida e mais de ¼ de século de profissão e sinto imenso prazer de lidar com os alunos, de trocar ideias, de tentar fazê-los pensar em tempo de unipensar doutrinatório. Tarefa ingrata como a de Sísifo, mas me faz muito bem.
E uma coisa todo mundo tem que ter em mente antes de decidir por essa profissão é que, diferentemente dos outros ofícios, não deixamos de ser aquilo quando saímos do local de trabalho. Um bancário deixa de ser bancário quando sai do banco ao final do expediente, um dentista deixa de ser quando sai do consultório, um músico não continua sendo músico quando não está tocando… Ninguém olha e diz: olá, bancário, olá, dentista, olá, músico... mas dizem "oi, professor!" Esse é um título que fica impregnado no nosso nome para sempre.
Algumas profissões como a que escolhi ficam entranhadas na pele. É como um pastor ou um padre… Daí talvez a associação do magistério como um sacerdócio. Quando estamos na rua, em festas, os nossos alunos ainda nos olharão como o professor, assim como no caso do padre ou do pastor. 

Essa é a essência do educador. Não estamos educadores, somos educadores e as pessoas esperam que nossas atitudes sejam dentro da expectativa do papel social que nos foi dado. Lembro quando vi uma professora minha pela primeira vez de bermuda em uma pracinha com a filha e fiquei chocado. Meu Deus! Ela é como a gente! Eu tinha 9 anos então…

Muitos anos depois, algumas alunas minhas da graduação me viram de bermuda e sandália em minha cidade e expressaram olhar de surpresa indisfarçável. Na aula seguinte, mandaram de cara: Gente, você usa bermuda e sandália.. [risos gerais na turma] Isso me fez lembrar de mim aos 9 anos de idade.

É isso. 

Era só uma bermuda, mas nos dá dimensão de como somos vistos e que somos referência mesmo fora do ofício e não estou falando de roupas, mas de atitudes. Principalmente, quando se trata de lidar com adolescentes e crianças...

Quem não quer esse peso de um título grudado no seu nome que não seja professor, padre ou pastor...

quarta-feira, 20 de junho de 2018

Ignorando em 3, 2,1... E seja feliz!

Outro dia li um texto sobre a necessidade de ignorarmos as pessoas que nos intoxicam de alguma forma, por exemplo, com seu radicalismo, com sua cegueira ideológica, com sua necessidade de convencer o mundo de que estão certas e, obviamente, de que são fodásticas. Ou, simplesmente, porque gostam de reclamar, fazer fofoca, encher o saco de alguma forma. Enfim, pessoas chatas para cacete que, muitas vezes, nos pulam na frente no dia a dia e com que teremos que lidar porque, de alguma forma, convivemos com elas em casa, no trabalho ou em grupos sociais diversos.
O texto é genial, mas deixa uma coisa no ar, como ignorar sem parecer rude. A vontade que eu tive durante anos era olhar para essas pessoas e dizer: desculpe, mas eu não pedi sua opinião, guarde para você ou para quem quer ouvi-la. Mas isso, reconheço é demasiadamente, rude. Dessa forma, seguem algumas sugestões que podem tornar sua vida mais leve. Pelos menos, funcionou comigo.... e ah, sim... aceito sugestões também.

1. Evite o contato visual ou criar situações interativas de comunicação com o inconveniente. Não quer dizer dar um gelo, não é isso. Fale com ele o mínimo. Cumprimente e seja gentil. Trata-se de não permitir que se crie o canal de comunicação que, muitas vezes, começa no visual e em cumprimentos mais longos. Se ocorrer da passagem em movimento no local onde convivem, acelere o passo. Pressa é sempre uma desculpa tácita.

2. Não adianta expor ao inconveniente o que você pensa sobre ele. Ele não vai mudar porque você pensa que ele é um pé-no-saco. E ainda vai criar um ambiente de animosidade desnecessário e contraproducente. Guarde o que você pensa sobre o cara para você. Evite até de compartilhar com outros colegas.  Até porque, de certa forma, podemos ser chatos para alguém e eu, pelo menos, não estou interessado no que outro pensa sobre mim uma vez que isso é um problema dele e não meu.

3. Fuja dos holofotes. Em caso de reunião, pense muito antes de falar. Veja se alguém não falou o que você iria dizer (repetir o que já falaram só para aparecer é bem escroto) ou se o que você tem a dizer é realmente MUITO necessário. Ir para o holofote atrai a atenção do chato igual a mosca na luz.

4. Só abra algum tipo de conflito quando for EXTRAMENTE necessário. Por exemplo, que envolva um prejuízo financeiro que lhe possa ocorrer ou um grande dano ao seu projeto profissional. Nesses casos, projete 30% dos conflitos ali, mas o grande choque deve ser nos bastidores e não no conflito direto.

5. Aprenda a ficar em silêncio e desenvolver uma vida interior de discussão mais rica. Saiba que da mesma forma que você não tem paciência com algumas pessoas. Pode haver pessoas que o acham desagradável também. Eu nunca perdi por calar na hora em que não deveria falar. Não fale só para pensarem que você é inteligente. Se você precisa disso para que elas se convençam, provavelmente, não o seja.

6. Na interação compulsoriamente  presencial oral, esquive-se. Nada incomoda mais alguém que quer aparecer em cima de você do que fazer uma interação, ser ouvido e, logo após, haver uma mudança brusca de assunto. Mas primeiro ouça. Depois viole máxima de relevância com outra pessoa envolvida na interação. Se está só você e o inconveniente, ouça (quanto mais falar, melhor) e ao final diga algo como: Então tá. 'té mais. Quem fala muito espera retorno proporcional, ser lacônico mata de raiva. Adoro essa técnica...

7. Na interação em redes sociais, ignore com seus recursos nativos. Às vezes, o inconveniente acha que sua Timeline é vitrine do ego dele. Aí resta apagar os comentários que é como dizer de forma sutil: não lhe perguntei nada. Guarde sua opinião para quando eu quiser ouvir ou insira em sua Timeline onde seus amigos quererão ler. Em segundo nível, crie uma lista e exclua da suas publicações o indesejável. E, em última instância, bloqueie. A primeira bloqueada é meio traumática, mas depois é até gostoso.

Ninguém diz que é fácil, mas toda prática requer tempo. Às vezes, coçamos de vontade de responder a altura coisas idiotas ou desagradáveis que ouvimos, mas pense: vai mudar o mundo? Não. Vai mudar pessoa? Não mesmo. Vai mudar a situação para melhor? Acredito que não. Se você respondeu sim a todas as perguntas, provavelmente o chato é você.

É claro que há casos e casos, mas, sinceramente, 95% das vezes entramos em tretas que não vão se resolver dessa forma e com pessoas com quem não vale nada a pena. Perda de tempo absurda como se o tempo fosse algo inesgotável.


E se a pessoa chegou até esse fim de texto e comentará: ignorando o texto em 3, 2, 1..., não entendeu  que é ignorar. Uma das definições do que é ignorar é não tomar conhecimento por ter desprezo ou indiferença. Aliás, por favor, nesse caso, se pretende isso, ignore. Farei o mesmo.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Depois de 2013... Acabou ficando nos R$ 0,20

Está fazendo 5 anos dos protestos de 2013. Sim.. aquele que o pessoal foi para a rua dizendo que não era pelos R$ 0,20 de aumento da passagem de ônibus. 
O mais impressionante naquela mobilização foi o caráter apartidário dos protestos. Eram pessoas comuns gritando contra a corrupção, contra os desmandos dos políticos gestores e, principalmente, contra um governo de um partido de mais de uma década que agora agonizava a olhos vistos (e viria a morrer tempos depois). 
Era um grito de “para, vamos refazer que não deu certo”. 
A coisa ia bem e, mesmo quando os grupos políticos começaram a se infiltrar para pegar carona na força do movimento e tirar proveito da situação, as pessoas viam o evento como algo legítimo. 
Até quando surgiam grupos como os Black Blocks, uma prova da existência da máquina do tempo, pois se trata de uma galera que veio dos anos 60 para gritar contra o capitalismo e imperialismo, os EUA, as multinacionais e, depois, confraternizar no Burger King. 
Foi uma mobilização nunca antes vista na história do país, mas que deu com os burros n’água. Por quê? O cenário era todo democraticamente favorável. 
Já na época apontei o problema central das coisas: falta de foco. Gritava-se pela ética, pela justiça, pelo bem comum.... mas isso é muito vago e fez a manifestação parecer aquele cachorro que corre atrás do caminhão e, quando o veículo para, ele fica sem saber o que fazer. Pois o governo parou e disse: tá! E o que vocês querem? 
Segue a lista: Justiça social Paz na terra Mais amor por favor... 

... Então Obviamente, é um exagero o que coloquei, mas foi mais ou menos assim. Faltou foco. Assim fica tenso, assim fica difícil... Mais paciência por favor... 

E, no final das contas, ficou só pelos 0,20.

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Curta história curta - Parte I: O influente

Durante uma vida gozou do prestígio de ser filho de juiz, neto de promotora e afilhado de ministra. Todas as portas se abriam para ele quando anunciava suas relações pessoais. Mas faleceu como todo mundo, seja influente ou não. De súbito e tão cedo, as pessoas diziam.  Tão bem relacionado não deixou seus contatos de herança para nenhum herdeiro. No velório, seu pai, juiz da 2ª divisão de futebol da cidade, sua avó, promotora de vendas da Natura e sua madrinha, ministra da eucarística davam as mãos e rezavam por sua alma.
Nesse momento, era recebido no céu por São Longuinho, o procurador (depois de 3 pulinhos, é claro)

segunda-feira, 4 de junho de 2018

Lógica do mecanismo

Assisti recentemente à série O mecanismo da NETFLIX. Sei que uma parcela dos colegas que assistiram ficaram profundamente ofendidos porque entenderam que a crítica era a um partido ou a uma pessoa.  Entretanto, o cerne da questão foi apresentado quando o personagem de Selton Mello, o policial Marco Ruffo,  se vê diante de uma funcionário da companhia de água que tinha um esquema de propina para consertar um vazamento com celeridade em frente a sua casa. Naquele momento, ele entende que o problema não são as pessoas, mas o mecanismo que existe desde que o Brasil existe como país. O mecanismo do oportunismo desonesto. 
O fato de alguns personagens poderem ser relacionados a figuras "sacras" da política nacional recente e, de alguma forma, representarem uma crítica à uma ideologia política que hoje se tornou uma fé cega cultuada por uma seita de fanáticos impediu os colegas de enxergar essa reflexão do José Padilha sobre a essência da nossa corrupção.
Um episódio na recente greve dos caminhoneiros e na escassez de combustível me levou a pensar sobre esse mecanismo. O governo abaixou o preço do diesel em 0,46 centavos, mas alguns postos ainda não reduziram o preço na bomba porque alegam que ainda estão com estoque pelos quais pagaram o preço sem essa redução. Ok. Entendo e acho justo... Alegam que precisam deixar o estoque com preço antigo acabar para aplicar os novos preços sem prejuízo. Muito justo.
Entretanto, fica a pergunta: quando o preço do combustível sobe, eles primeiro esperam acabar o estoque que compraram com preço mais barato para depois colocar o preço novo ou eles cobram pelo estoque que pagaram menos o valor já majorado? Sim. Essa pergunta é retórica.
Enfim... li uma verdade assustadora no Facebook...

O Brasil é um monte de gente tentando se dar bem sozinha e se fudendo juntas.

E toca o barco... :-(