quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Quando auxílio social vira algema

"Estou cego, estou cego, repetia com desespero enquanto o ajudavam a sair do carro, e as lágrimas, rompendo, tomaram mais brilhantes os olhos que ele dizia estarem mortos."
SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira


Manter programa de auxílio com bolsas em dinheiro sem uma contrapartida social efetiva é criar uma dependência e um tipo de escravidão que interessa a quem? 
Em 1888, a escravidão acabou no Brasil, mas a sociedade se encarregou criar maneiras de substituir esse processo de dominação por outro. Veio o trabalho assalariado que criava um vínculo patrão-empregado altamente interessante para o patrão já que o operário era uma peça que, se trincasse, seria substituída. E a manutenção dessa peça era obrigação da própria “peça” com o que recebia uma vez por mês.
Na era da informação, essa forma se perpetua. Mas como escravizar aquele que não tem salário? Como fazê-lo viver sob meu domínio sem esse vínculo da carteira azul?
Pois é simples, diria Maquiavel (se estivesse aqui e propusesse os métodos aplicados em O príncipe e que lhe permitiram virar adjetivo em português, maquiavélico): Dê ao miserável uma bolsa de 50 reais por mês. O suficiente para não deixá-lo morrer de fome e o necessário para lhe ser grato. No outro mês, faça o mesmo, mas jamais lhe dê ofício que permita gerar esses 50 reais ou mais. Não ofereça a seus filhos escolas dignas que lhes permitam crescer e pensar por conta própria. Dê-lhes o mínimo para que, amanhã, sejam os herdeiros dos 50 reais que pingam, mas não secam. Pronto. Está feito. E toda vez que alguém se levantar contra sua maneira de agir, grite à legião de miseráveis que as vozes que se opõem são as vozes que não sabem a dor de um estômago vazio, são as vozes que querem acabar com aqueles que se preocupam com o povo.
Eis a fórmula pronta que, mesmo ao mais maquiavélico dos líderes, causaria rubor nas faces.
Isso muito me inquieta. A cegueira do próximo me inquieta.